Rabinos e parocos trabalhem juntos pela paz

Andressa Collet – Cidade do Vaticano

O Papa Francisco recebeu no Vaticano um grupo que celebra a memória do pioneiro do ecumenismo e do diálogo inter-religioso, por ocasião dos 50 anos da sua morte. Que o Card. Bea, disse o Papa em discurso, continue sendo modelo de inspiração para a amizade e o diálogo entre hebreus e cristãos: “seria bonito que, na mesma cidade, rabinos e párocos trabalhassem juntos, com as respectivas comunidades, a serviço da humanidade que sofre e promovendo caminhos de paz e de diálogo com todos”.

O Papa Francisco recebeu nesta quinta-feira (28) de fevereiro de 2019, na Sala do Consistório, no Vaticano, um grupo seguidor do Cardeal Agostinho Bea que, através de diferentes iniciativas, celebra os 50 anos da sua morte. O cardeal alemão, pioneiro do ecumenismo e do diálogo entre Judaísmo e Catolicismo e um dos pilares do Concílio Vaticano II (1962-1965), faleceu em 16 de novembro de 1968.

No seu discurso, o Pontífice enalteceu “a série de conferências de alto nível” promovida pelo Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos, Instituto Bíblico e Universidade Hebraica de Jerusalém em memória do Card. Bea para “revisitar esta distinta figura e a sua influência decisiva” no Concílio Vaticano II. Temas como “as relações com o Judaísmo, a unidade dos cristãos, a liberdade de consciência e de religião” ressoam ainda hoje como extremamente atuais.

Seguir o modo de fazer de Card. Bea

Card. Bea não deve ser lembrado apenas pelo que fez, mas também através do modo que o fez, disse o Papa, um modelo inspirador para o diálogo ecumênico, inter-religioso e também “intrafamiliar” com o hebraísmo. Francisco então citou Nahum Goldmann, presidente do Congresso Mundial Judaico, que descreveu o prelado alemão com três expressões características de quem trabalha na reconciliação dos homens: “compreensivo, cheio de bondade humana e corajoso”.

“Em primeiro lugar, a compreensão em relação aos outros. O Card. Bea era convicto que o amor e o respeito são os primeiros princípios do diálogo. Dizia que o ‘respeito nos ensinará inclusive a maneira justa de propor a verdade’. É verdade: não há verdade fora do amor, e o amor se declina em primeiro lugar como capacidade de acolher, abraçar, levar consigo: ‘compreender-se’. O segundo aspecto: a bondade e a humanidade, o saber criar, isto é, vínculos de amizade, relações fundadas na fraternidade que nos irmana enquanto criatura de Deus que é Pai e nos deseja irmãos. Compreensão que aceita o outro, bondade que descobre e cria relações de unidade; tudo isso era reforçado nele – terceiro aspecto – através de um temperamento corajoso. 

O Concílio Vaticano II e a escola de Bea

O Papa lembrou, então, que o Card. Bea não era nem otimista, nem pessimista, mas realista sobre o futuro da unidade. O prelado precisou enfrentar muitas resistências nesse trabalho para o diálogo: mesmo sendo acusado e caluniado, disse Francisco, seguiu em frente, “com a perseverança de quem não renuncia de amar”.

O cardeal dizia: “o Concílio não poderá ser um ponto de chegada, mas, sim, um ponto de partida”, recordou o Papa, ao enaltecer o “frutuoso caminho realizado no diálogo entre hebreus e católicos” depois da escola de Bea. Um percurso que fez a Universidade Gregoriana, através de pedido da Santa Sé, instituir “o projeto mais importante dos estudos judaicos da Igreja Católica (Declaração Conjunta sobre os Estudos Judaicos de 14 de novembro de 2002)”.

Testemunho do ensino conjunto de hebreus e católicos

O Pontífice parabenizou a escolha “nada fácil” dos alunos de estudar o mundo hebraico, tão rico e complexo. Aos professores, agradeceu pela dedicação e se dirigiu, de modo especial, àqueles docentes hebreus:

“Vocês ensinam num ambiente onde a presença de vocês representa uma novidade e já assim é uma mensagem. Como, de fato, introduzir um diálogo autêntico sem um conhecimento a partir de dentro? O diálogo deve ser levado adiante em duas vozes, e o testemunho de docentes hebreus e católicos que ensinam juntos vale mais de muitos discursos.”

Diálogo inter-religioso além da comunidade científica

O Papa então questionou: “como prosseguir o caminho?”. Até agora o diálogo hebraico-cristão normalmente acontece num ambiente reservado a especialistas, mas “o aprofundamento e o conhecimento específicos” não bastam, alertou Francisco, é preciso percorrer um outro, “mais amplo, aquele da difusão dos frutos para que o diálogo não permaneça privilégio de poucos, mas se torne oportunidade fecunda para muitos”. A figura e a obra do Card. Bea pode ser um estímulo na busca da unidade entre os cristãos e na promoção concreta de uma amizade renovada com os irmãos hebreus, enfatizou o Papa.

“A amizade e o diálogo entre hebreus e cristãos são, de fato, chamados a ultrapassar as fronteiras da comunidade científica. Seria bonito, por exemplo, que, na mesma cidade, rabinos e párocos trabalhassem juntos, com as respectivas comunidades, a serviço da humanidade que sofre e promovendo caminhos de paz e de diálogo com todos. ”