136 – O diálogo inter-religioso

O dialogo inter religioso

O Depois de duas décadas, multiplicaram-se as iniciativas dos encontros inter-religiosos. Primeiro vieram os encontros judaico-cristãos, mas também encontro com mais vozes, junto também com muçulmanos e budistas. Um fenômeno novo, de moda, ou ao sabor dos tempos? Pode até ser isso, mas tais encontros seriam impensáveis há 60 anos[1].

Desde 1945 muitas iniciativas têm avançado: Jules Isaac com as associações de "Amizades Judaico-Cristãs", Vaticano II, "A Fraternidade de Abraão". Assis, "Escola leiga das Religiões", "Construtores da Paz".

Para as bases do diálogo

Alguns judeus ortodoxos rejeitam esse diálogo por várias razões, dizendo que as outras religiões estão no erro, e que somente os judeus têm a verdade; dizem que o diálogo não serve para nada e que cada um manterá as suas posições; que é preciso se separar das nações (cf. Nm 23,9); elas querem nos converter e nós devemos resistir.

Quando falamos em desafios, parece ser importante de começar a responder a essas afirmações.

O que significa dizer que uma religião está no erro? Que as suas premissas estão erradas, que Jesus não é o Messias, que o Al Corão é falso, que o Budismo é uma espiritualidade sem Deus? Mas isso é contrário aos princípios bíblicos que afirmam que cada nação deve ser fiel à religião de seus pais. Escutemos o profeta Miquéias (4,5), quando diz: "Todos os povos caminham, cada qual pelo nome do seu deus, nós, porém, caminharemos pelo nome do Eterno, nosso Deus, para sempre". Escutemos o profeta Malaquias (1,10) quando ele lembra a Israel: "Pois, de onde nasce o sol até onde ele se põe, o meu Nome é glorificado entre as nações". Repitamos, o judaísmo admite a diferença quanto ao plano dogmático. Mesmo que existam contradições entre a fé dos dois, essas contradições devem ser mantidas, pois elas expressam a pluralidade do mundo. A humanidade é aquilo que é, cada religião ou espiritualidade é rica de fervor, tem sede de Absoluto, conhece e ainda possuem grandes mestres, grandes sábios, grandes místicos que merecem o nosso respeito. O fervor não pode estar no erro. Ele deve ser simplesmente canalizado para o bem, e não para a negação do outro.

"Esse diálogo não serve para nada" – tal argumento testemunha que na verdade nunca houve diálogo. O diálogo permite a cada um de permanecer o mesmo, mas com a troca, com o enriquecimento de sua própria fé. Muitas vezes os mestres do Talmud também discutiram com pagãos, com os Epicuristas, com os idólatras. Quanto mais hoje o encontro com as religiões estão cheios de humanismo e de um espírito de paz.

Na verdade quando Deus se dirige a Abraão Ele está se dirigindo também à humanidade inteira, para que cada povo possa desenvolver a sua própria cultura, e partilhar a sua maneira de ser, como sinal de bênçãos para os outros.

O diálogo com o Cristianismo

Os litígios com a Igreja Católica é certamente pesado. As Cruzadas, a Inquisição, as falsas acusações ou o silêncio suspeito de Pio XII pesam ainda na consciência judaica[2]. Pesa ainda igualmente quando um grande teólogo protestante como Karl Barth (1886-1968) afirmou que o povo judeu era "uma chaga sobre o corpo do Cristo". E mesmo a Igreja Ortodoxa ainda tem muito a se livrar ainda dos clichês anti-judaicos. Todas essas atitudes são condenáveis, mas revelam igualmente que os seres humanos são pessoas com as suas misérias, e que não foram capazes (ainda) de se elevar para o espírito monoteísta. A ética religiosa é um ideal a alcançar.

A Igreja tem feito imensos esforços desde o Vaticano II. O reconhecimento de o povo judeu ser como um "irmão mais velho", e do Estado de Israel como realidade incontestável, do valor permanente da Primeira Aliança, a redescoberta do judaísmo de Jesus, a supressão da Teologia da Substituição, as viagens dos Papas João Paulo II, Bento XVI e Francisco à Jerusalém, não são simples atos de humor, mas traduzem uma verdadeira coragem de humildade.

Com os protestantes a relação sempre foi mais natural, por causa da interpretação do Livro, ou pelos sofrimentos partilhados e a tese de Barth nada retirou dos corajosos protestantes da Segunda Guerra, quando eles esconderam os judeus.

Acredito que somente um tempo juntos em estudo, em oração, permitirá suprimir essas incompreensões que sempre se encontram na origem da desconfiança e do ódio. Será o judeu que deve ajudar o não judeu a remover o antissemitismo. Mas não nos iludamos, será preciso muito tempo para que essas boas intenções dos pioneiros do diálogo se tornem sentimentos partilhados pelo conjunto do mundo cristão. E percebamos que muitos cristãos de muitíssimas denominações procuram voltar às fontes: ao estudo do hebraico, à Bíblia Hebraica, à Terra de Israel, ao Midrash, conhecer a prática judaica. O cristianismo procura remover os bezerros de ouro, Israel não pode se tornar indiferente a essa procura.

O diálogo com o Islamismo

A abertura de um diálogo com as Mesquitas também estão num bom caminho. No mundo sefaradi, a comunidade judaica é naturalmente sensível à alma árabe. No plano da fé, o mesmo monoteísmo exigente é proclamado, e o fato de não querer se substituir a Israel permite um face a face sem ambiguidades. Vimos como na Idade Média, de Saadia Gaon até Maimônides, souberam integrar a filosofia árabe. Esse encontro foi possível, e pode ser ainda hoje. É certo que o desejo de integrismo muçulmano ameaça as democracias do mundo e nega toda possibilidade de diálogo. 

Muitos intelectuais procuram repensar o discurso do Al Corão em termos de modernidade, abertura e de tolerância. Quanto ao conflito Israelense-Árabe, as políticas que trabalham sobre um acordo de paz sabem que a região sempre terá muito mais a ganhar pelo pacifismo do que pela guerra, onde todos saem perdendo.

Boa vontade existe de ambos os lados. Ela oferece o desafio de uma reformulação dos conceitos religiosos numa linguagem moderna, propondo uma educação que leve a sério a medida das suas propostas. 


[1] Cf. Haddad, Philippe. Pour expiquer le judaïsme a mes amis. Paris: Editions in Press, 2013. p. 220.
[2] Cf. Haddad, Philippe. Op.cit., p. 222.