29 – Yavné

29 Yavne

A interpretação oral, que até então produzido diferentes escolas exegéticas mais ou menos independentes, transformou-se num verdadeiro sistema analítico até chegar à proposta de treze regras hermenêuticas para extrair do texto escrito, as regras desconhecidas dos Hebreus. Essa maleabilidade da lei permitiu ao judaísmo se adaptar às novas condições históricas e sociológicas.

Um dos principais artesãos dessa reconstrução foi o Rabi Yohanan Ben (filho de) Zakai. Antes mesmo da destruição do Templo, e prevendo a catástrofe, ele conseguiu uma cidade das autoridades romanas, a cidade de Yavné, para o estudo da "Torah e seus sábios". Quando os Zelotes, ou os Saduceus afirmavam que um povo sem terra era como uma alma sem corpo, os Fariseus respondiam que eles acreditavam na imortalidade da alma. A prova da sobrevivência espiritual era aqui mais existencial que teológica.

Após a destruição da capital Jerusalém, e tendo ultrapassado a dor, Rabi Yohanan organizou a vida em Yavné. Um novo conselho de sábios foi constituído com o encargo de ensinar, de educar na legislação social e religiosa. Certo número de medidas foram tomadas para substituir o culto do destruído Templo. A liturgia foi revista e adaptada, a oração substituiu os sacrifícios e as súplicas pelo retorno à independência e a reconstrução do Templo foram reelaboradas. Entre as tarefas urgentes, ele teve que estabelecer um calendário para os judeus que tinham permanecido na Palestina mas também para aqueles que viviam na Babilônia, pois desse calendário dependiam todas as festas, "as reuniões" com Deus.

O Sinédrio tinha por seu presidente (Nassi) a autoridade reconhecida pelos romanos. Quando mais tarde foi preciso escolher um novo presidente, foi escolhido o Rabban Gamaliel, escolhido porque descendia do Rei Davi. Essa nomeação conferiu ao Sinédrio um aspecto de realeza e os Romanos julgaram que os Fariseus não eram de fato um perigo militar contra a sua própria autoridade.

O trabalho de interpretação da tradição escrita foi um sucesso. Existiam numerosos professores orais, mas era formalmente proibido de escrever o que fosse com o medo de se confundir ou oferecer a esses escritos uma igualdade de importância com a Torah escrita. Mas a situação original tinha mudado: a guerra, a instabilidade política, as discussões das escolas, tinham levado às inseguranças no campo da prática religiosa. De fato os rabinos se encontraram num verdadeiro dilema: por um lado, era muito necessário unir o povo através de ritos comuns, e por outro lado era importante deixar um pouco de liberdade na interpretação, pois era impensável estabelecer um magistério dogmático. E isso gerou finalmente à compilação, à redação da Mishná, termo que significa "ensinamento repetido" pois a tradição oral era repetida de cor. Isso resultou numa enciclopédia de seis volumes que iria posteriormente se tornar a referência legislativa da sociedade de Israel.

E começaram a reunir as fontes, as tradições, os costumes, as interpretações. A atividade imensa intelectual de Yavné suscitou outras ações do mesmo tipo por algumas partes da terra. Entre os grandes mestres da hermenêutica citamos Rabi Akiba, que mergulhou "quarenta anos nas águas da Torah" e se tornou um dos faróis da sua geração. Para ele cada letra, cada pequenina parte, cada repetição aparente do texto oferece "colinas de interpretações". Seu colega, Rabi Ishmael, mais apegado ao sentido literal, se opõe a seus caminhos, afirmando que as redundâncias do texto acontecem porque a "Torah fala a linguagem dos homens". Ambos mencionados na Mishná, não se contradizem na verdade. Eles deixam a oportunidade aos futuros mestres de escolher segundo seu temperamento e sua sensibilidade o melhor caminho a seguir. A seguir surgiram outras obras de comentários de caráter ético, exegético ou filosófico, o Midrash ou "Procura" do sentido do texto da Escritura. Foi em Yavné que se formou oficialmente o Cânon dos 24 livros da Bíblia Hebraica e que se introduziram os rolos de Salomão, como o Cântico dos Cânticos, o livro do Eclesiastes, ou o Livro de Ester, redigidos durante o exílio persa e que continha somente uma vez o nome de Deus.


[1] Um dos títulos rabínicos: Rabi = meu mestre; Raban = nosso mestre.
[2] Tratado Sanhedrin, página 64 b (verso).