Parashat Vayera Gn 18

CENTRO CRISTÃO DE ESTUDOS JUDAICOS - Estudo da Parashá da Semana – Cristãos estudando as fontes judaicas
PARASHAT VAYERA: E ELE APARECEU - Gn 18,1 – 22,24 - Rabbi Eliyahu Safran
Pearls from the Torah. Something old, something new. New York: Ktav Publishing House, 2018, p. 47 – 50.

Um amigo em necessidade

Um amigo é uma única alma habitando em dois corpos – Aristóteles.

Imagine a cena, um homem recém-circuncidado; a apenas três dias de um procedimento doloroso e ainda em convalescença. Ele não só se sente extremamente desconfortável, mas também não é um “jovenzinho” - é, na verdade, um idoso. Portanto, temos um velho, debilitado e com dor, sentado diante de sua tenda quando nossa parasha se abre, "Vayeirah eilav Hashem b’Elonei Mamre ..." E o Eterno Deus apareceu diante dele nas planícies de Mambré.

Que abertura curiosa, “… apareceu diante dele…” Diante de quem? Não há antecedente, nenhum nome para sabermos para quem Deus apareceu antes. Sem nome. Nada. Apenas o impessoal, “Ele”.
Quem, um leitor atento pode perguntar, é "Ele”?

Sabemos, a partir do nosso contexto mais amplo da narrativa da Torah, que o “ele” não é outro senão Abraão, Avraham avinu (Nosso pai Abraão). Só que este não é mais o Abraão que conhecemos, não é mais o Abrão chamado a dar as costas à terra de seu nascimento e à sua família e partir em uma jornada cujo propósito só seria revelado à medida que se desenvolvesse; não mais apenas um homem de estatura e riqueza.

O Abraão que encontramos aqui está agora em um nível superior; este é o homem que agora assumirá o manto do pai espiritual de toda a humanidade, o homem que - apenas três dias após a circuncisão - estava enfraquecido e com dores físicas, e no entanto, estava ansioso para estar disponível aos outros! Ele estava proativamente procurando a oportunidade de realizar um ato de chesed – misericórdia.

O que? Não querendo apenas rolar na cama e gemer por seu desconforto como a maioria de nós gostaria de fazer? Não, Abraão buscava sempre uma oportunidade para realizar chesed - misericórdia, afinal, o que é a vida sem chesed ?

E assim a nossa cena da parasha abre com Deus vindo visitá-lo, para reconhecer este novo Abraão e para honrá-lo e revelar que este homem é o "verdadeiro parceiro”.

O Or Ha Chaim vê neste compromisso uma lição fundamental da Torah, que quando as pessoas realizam grandes feitos, Deus se revela a eles como um símbolo de reconhecimento; isto é, quando o ser humano faz o bem, Deus deseja que seja reconhecido e conhecido. E então Deus vem a Mambré para visitar Seu amigo, como muitos de nós fazemos quando um amigo está se recuperando. Ao fazer isso, Deus está deixando claro que ele se tornou uma “carruagem da Presença Divina”.

Na tenda de Abraão, uma casa de chesed - misericórdia extraordinária, Deus sente-se confortável. Ainda mais, Ele deseja que todos saibam que Ele se sente bem em tal ambiente. Deus está dizendo: “Este homem é meu amigo. Este homem é um homem com quem gosto de estar”.

Tudo bem, mas se for esse o caso, por que não dizer, Vayeira al Avraham…? Por que não dizer, Deus apareceu a Abraão? Por que, “para ele”? Ainda mais, nesta visita, Deus não parece revelar uma mensagem a Abraão, ao contrário de outras ocasiões da revelação de Deus a Abraão quando Ele comunica mensagens muito específicas.

Nesta “não-especificidade” encontramos a profundidade desta relação maravilhosa entre Deus e Abraão, esta amizade e, de fato, da amizade em geral. Ao contrário de muitas outras coisas em nosso mundo, em que quase todo envolvimento entre as pessoas é transacional, um “toma lá dá cá”, uma extensão de negócios - com um objetivo ou finalidade específica - a comunicação entre amigos genuínos não é transacional. Não há especificações porque não há necessidade delas.

Como sugere o Rabino Soloveitchik, quando dois indivíduos são amigos íntimos, “... compartilhando um senso de intimidade e companheirismo, um não precisa ter uma mensagem para ter que entregar a fim de entrar na casa do outro. A forma mais elevada de amizade não precisa de palavras.

E é o que vemos nesta parasha. Até este ponto, havia formalidade entre Deus e Abraão. Ainda não era uma amizade. Havia uma qualidade clara de “Mestre / Servo” em seu relacionamento. Nesse relacionamento, havia “vayomer” – E Deus falou. Houve declarações, comandos, formalidades. Mas agora, com a circuncisão de Abraão e sua aliança divina, seu bris - pacto, estabelecido para sempre, havia uma nova intimidade, uma amizade. Nessa amizade não havia mais necessidade de palavras, de uma mensagem formal. É sobre “você e Eu”.

É algo pessoal. Não é sobre “negócios”.

Como Rabino Soloveitchik continuou dizendo: “Desde que o relacionamento seja formal, ele é guiado pelas regras de cortesia. A formalidade requer a menção do nome. Mas quando visitamos um amigo, não há necessidade de dizer o nome.

Que coisa maravilhosa, para Abraão e Deus compartilharem uma amizade! Mas é muito mais maravilhoso perceber que essa amizade não precisa ser exclusiva apenas de Abraão; Deus nada mais gostaria do que ter esse relacionamento com todos nós!

O Meor Einaim ensina que Deus busca a amizade de cada um dos Seus filhos, desde que O permitamos entrar. Como permitimos que Deus entre? Como nos engajamos com Deus para que nosso relacionamento seja pessoal e não transacional?

Realizando a chesed – misericórdia.

Ao realizar atos de chesed - misericórdia, Avraham Avinu – nosso pai Abraão – demonstrou pelo exemplo como devemos nos comportar no mundo, como a bondade deve imbuir nossas ações e comportamento a cada dia de nossas vidas, como nosso comportamento não apenas convida Deus a esse relacionamento, mas deixa claro aos outros que temos esse relacionamento com Deus. Rav Moseh de Kobrin, ensinou que, “Um dia em que não fazemos uma gentileza não deve ser considerado um dia em sua vida”.

Tal sentimento sugere que, como Avraham Avinu, não é suficiente a forma passiva de não fazer a coisa errada; em vez disso, é necessário buscar oportunidades de forma proativa para fazer a coisa certa. Isto é, não devemos nos sentar diante de nossas tendas até que estranhos venham até nós, mas devemos sair para fora de nossas tendas e encontrar maneiras de demonstrar nossa bondade amorosa. Afinal, isso é tão essencial para uma vida de fé quanto o comer e o rezar.
E, se devemos demonstrar tais atos de bondade aos que não conhecemos, quanto mais aos nossos amigos, que nos são tão queridos que não precisamos de palavras para descrever ou compartilhar essa proximidade?
A pergunta que sempre nos fazemos é: Deus realmente gostaria de ser meu amigo? Frequentemente, vemos Deus como a poderosa força motriz do mundo; Aquele que comanda. Mas o compreendemos também como Aquele que busca um relacionamento pessoal conosco?

As coisas que muitas vezes procuramos na vida são, não de forma surpreendente, as mesmas coisas que acabamos vendo. Se “vermos” isso como possível, pode ser. Viver com uma maior consciência de Deus, irá trazer a “Ele” muito mais próximo de nós.

Com frequência, reconhecemos Deus no transcendental - numa bela sinfonia, no céu majestoso listrado com os vermelhos do entardecer, nas deslumbrantes florestas ou nas ondas poderosas do oceano. Mas, como um amigo que não nos visita em ocasiões especiais, mas a qualquer momento, para uma xícara de chá, um momento para uma conversa, um tapinha nas costas, podemos reconhecer Deus nos milagres diários de nossas vidas.
Diz-se que, quando se faz uma bênção sobre o pão, sobre as refeições, sacudimos os alicerces do universo. Uma simples bênção, abalando os alicerces da criação? Claro!
Bênçãos sinceras de uma pessoa com fé, um simples ato de chesed - misericórdia, podem enviar ondas através da criação.
Quanto mais buscamos a Deus de forma proativa, mais Ele se aproxima de nós. Deus está esperando por nós, para nos envolvermos nesse relacionamento pessoal, nessa amizade.
Se a pergunta for: Deus gostaria de ser meu amigo? A resposta é sim!
Vayera “eilav” HaShem – E apareceu para “ele” o Eterno Deus.
Com Deus, a amizade não é um negócio. É pessoal.

Parashat Vayera 2

Parashat Vayera 3

Para avançar na reflexão:

  1. O que as seguintes citações bíblicas falam sobre Vayera: Ex 33,11; 6,14; Sl 4,4; Pr 27,17; Is 41,8?
  2. Analisa imagem seguinte e compare com a citação de Jo 15,15 e as indicações da Parashat Vayera
  3. Que outras questões podem ser levantadas?